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O auxílio doença é um “benefício concedido ao segurado impedido de trabalhar por doença ou acidente, ou por prescrição médica (por exemplo, no caso de gravidez de risco) acima do período previsto em lei como sendo de responsabilidade do empregador e, nos demais casos, a partir do início da incapacidade temporária (CASTRO; LAZZARI, 2017, p. 493).

Está previsto nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91 (Planos de Benefícios da Previdência Social) e nos artigos 71 a 80 do Decreto nº 3.048/99 (Regulamento da Previdência Social).

Com a Reforma da Previdência, o segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social após a data de entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 103/2019 será aposentado aos 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, com 15 (quinze) anos de tempo de contribuição, se mulher, e 20 (vinte) anos de tempo de contribuição, se homem, além da carência mínima de 180 contribuições mensais (artigo 19 da referida EC).

Mas o questionamento que fica é: o tempo que o segurado esteve em gozo do auxílio-doença pode contar como carência para a aposentadoria?

Conforme o artigo 26 do Decreto 3.048/99, período de carência é o tempo correspondente ao número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas as competências cujo salário de contribuição seja igual ou superior ao seu limite mínimo mensal.

O artigo 55, inciso II, da Lei n. 8.213/91 dispõe que o lapso intercalado em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez conta como tempo de contribuição.

Assim como o artigo 60, incisos III e IX do Decreto n. 3.048/99:

Art. 60. Até que lei específica discipline a matéria, são contados como tempo de contribuição, entre outros: 

(…) 

III – o período em que o segurado esteve recebendo auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, entre períodos de

atividade; 

(…) 

IX – o período em que o segurado esteve recebendo benefício por incapacidade por acidente do trabalho, intercalado ou não.

No entanto, o dispositivo acima foi revogado pelo Decreto 10.410/2020, que incluiu o artigo 19-C, bem como seu §1º que dispõe que “será computado o tempo intercalado de recebimento de benefício por incapacidade, na forma do disposto no inciso II do caput do art. 55 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, exceto para efeito de carência”.

Até então não se tinha previsão acerca do cômputo como carência do lapso intercalado do auxílio-doença, o que mudou com a publicação do Decreto nº 10.410, de 30 de junho de 2020.

Todavia,  em  maio  de  2020,  foi  publicada  a  Portaria  Conjunta DIRBEN/PFE/INSS nº 12, decorrente da decisão judicial proferida na Ação Civil Pública-ACP nº 0216249-77.2017.4.02.5101/RJ, determinando ao INSS que compute, para fins de carência, o período em gozo de benefício por incapacidade não acidentário intercalado e o período em gozo de benefício por incapacidade acidentário, intercalado ou não.

Assim, conforme o artigo 2º da Portaria, até que seja julgado o recurso interposto pelo INSS e expedido um parecer de força executória definitivo, deve ser cumprida   a   decisão   judicial   desta   ACP   nos   moldes   da   ACP   de   nº 2009.71.00.004103-4/RS, ou seja, computar, para fins de carência, o período em gozo de benefício por incapacidade, inclusive os decorrentes de acidente do trabalho, desde que intercalado com períodos de contribuição ou atividade, conforme  artigo  153,  §  1º,  da  Instrução  Normativa  nº  77/PRES/INSS, de 21/01/2015.

Ainda, o artigo 3º prevê que o dispositivo acima produz efeitos para benefícios com data de entrada de requerimento (DER) a partir de 20/12/2019 e alcança todo o território nacional.

Por fim, importante mencionar o posicionamento do INSS, do TNU, do STF e do STJ quanto ao tema, conforme os autores Carlos Alberto e João Lazzari (2017, p. 361, 362):

O INSS adotava o entendimento de que o período em gozo de benefício por incapacidade não é computado para efeito de carência, mesmo quando intercalado. (…) No entanto, o INSS, em cumprimento à decisão proferida em Ação Civil Pública nº 000410329.2009.4.04.7100 (antigo nº 2009.71.00.004103-4), que determinou o cômputo do período de recebimento de benefício por incapacidade para fins de carência, se intercalado com períodos de atividade ou contribuição, editou a IN INSS/PRES nº 86, de 25/04/2016, alterando a IN PRES/INSS nº 77/2015, que passou a vigorar com as seguintes modificações:

Art. 153. (…) § 1º Por força da decisão judicial proferida na Ação Civil Pública nº 2009.71.00.004103-4 (novo nº 0004103-29.2009.4.04.7100) é devido o cômputo, para fins de carência, do período em gozo de benefício por incapacidade, inclusive os decorrentes de acidente do trabalho, desde que intercalado com períodos de contribuição ou atividade, observadas as datas a seguir: II – para os residentes nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, a determinação permanece vigente, observada a decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial nº 1.414.439-RS, e alcança os benefícios requeridos a partir de 29 de janeiro de 2009.

A orientação fixada pela TNU é de que não existe óbice legal para o cômputo dos períodos em gozo de benefício por incapacidade para fins de carência, desde que intercalados com períodos de contribuição. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 73: “O tempo de gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez não decorrentes de acidente de trabalho só pode ser computado como tempo de contribuição ou para fins de carência quando intercalado entre períodos nos quais houve recolhimento de contribuições para a previdência social”.

O STF reconhece, ainda, o cômputo para fins de carência dos períodos de gozo de auxílio-doença, quando intercalados. Nesse sentido:

“EMENTA. Agravo regimental no recurso extraordinário. Previdenciário. Aposentadoria por invalidez. Cômputo do tempo de gozo de auxílio-doença para fins de carência. Possibilidade. Precedentes. 1. O Supremo Tribunal Federal decidiu, nos autos do RE nº 583.834/PR-RG, com repercussão geral reconhecida,  que  devem  ser  computados,  para  fins  de  concessão  de aposentadoria por invalidez, os períodos em que o segurado tenha usufruído do benefício de auxílio-doença, desde que intercalados com atividade laborativa. 2. A Suprema Corte vem se pronunciando no sentido de que o referido entendimento se aplica, inclusive, para fins de cômputo da carência, e não apenas para cálculo do tempo de contribuição. Precedentes: ARE 802.877/RS, Min. Teori Zavascki, DJe de 1.4.14; ARE 771.133/RS, Min. Luiz Fux, DJe de 21.2.2014;  ARE  824.328/SC,  Min.  Gilmar  Mendes,  DJe  de  8.8.14;  e  ARE 822.483/RS, Min. Cármem Lúcia, DJe de 8.8.14. 3. Agravo regimental não provido.” (STF – RE: 771577 SC, Relator: Min. Dias Toffoli, j. 19.8.2014, 1ª Turma, DJe 213 publ. 30.10.2014).

Sobre o tema, o STJ deu interpretação ainda mais ampla ao admitir o período de gozo de auxílio-acidente para fins de carência. Segue a ementa dessa decisão:

“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. CÔMPUTO DO PERÍODO DE RECEBIMENTO APENAS DE AUXÍLIO-ACIDENTE PARA A CARÊNCIA NECESSÁRIA À CONCESSÃO DA APOSENTADORIA POR IDADE. POSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. 1. O auxílio-acidente – e não apenas o auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez – pode ser considerado como espécie de “benefício por incapacidade”, apto a compor a carência necessária à concessão da aposentadoria por idade. 2. In casu, é de ser observada a vetusta regra de hermenêutica, segundo a qual “onde a lei não restringe, não cabe ao intérprete restringir” e, portanto, não havendo, nas normas que regem a matéria, a restrição imposta pelo Tribunal a quo, não subsiste o óbice imposto ao direito à pensão por morte. 3. Recurso especial conhecido e provido.” (REsp 1.243.760/PR, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 9.4.2013).

Diante  do  exposto,  nos  resta  aguardar  a  posição  desse  tema  pelo  Poder Judiciário e pelo INSS após a inclusão do artigo 19-C pelo Decreto nº 10.410/20.

É necessário ter cautela quanto às modificações recentes e às normas que vêm surgindo. Se você é advogado, deve-se manter atualizado nas disposições pertinentes ao caso concreto.

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário, Editora Forense, 2017.

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